Da perfeição
Às vezes, deitada, a sensação de relaxamento é tão grande que o corpo desaparece debaixo dos olhos fechados. Fica só a sensação de não querer recuperar o movimento das pernas, dos braços, das mãos, sobra só o contato da cabeça com o travesseiro ou o braço da poltrona. Nesse momento a sensação é a mais desejável: não ter um corpo para cuidar, não ter o que pensar, não ter que levantar, não ter que viver.
Quisera eu nunca ter adquirido essas pretensões, essas ambições, essas insistências. Só assim eu me contentaria em começar a dieta às segundas-feiras, constatar o aumento do preço do arroz e feijão, reclamar do presidente e votar nele na eleição seguinte. Ou entraria em um concurso público qualquer, e voltaria todo dia para casa satisfeita em ter um marido e uma novela me esperando na sala. Nascer, engatinhar, crescer, ir à Disney, reproduzir, pedir netos, morrer.
A vida é perfeita quando se admite a inutilidade de tentar ser melhor que isso.
Quisera eu nunca ter adquirido essas pretensões, essas ambições, essas insistências. Só assim eu me contentaria em começar a dieta às segundas-feiras, constatar o aumento do preço do arroz e feijão, reclamar do presidente e votar nele na eleição seguinte. Ou entraria em um concurso público qualquer, e voltaria todo dia para casa satisfeita em ter um marido e uma novela me esperando na sala. Nascer, engatinhar, crescer, ir à Disney, reproduzir, pedir netos, morrer.
A vida é perfeita quando se admite a inutilidade de tentar ser melhor que isso.
1 Comments:
O problema é que descobrir que se pode ser melhor que isso, mesmo que seja inútil, é um caminho sem volta. Comemos a fruta e somos desterrados porque percebemos que o paraíso não é paraíso, que o paraíso é uniformidade, e uniformidade é uma merda.
E pô, "o corpo desaparecer debaixo dos olhos fechados" é como deixar de existir e não morrer. Um suicídio sem morte, sabe?
(Nossa, eu tô mórbido. Depois reclamo que você tem medo de mim...)
By Edson, at sexta-feira, setembro 23, 2005
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