Sob as luzes do tablado
- Há quanto tempo está aqui?
- Não muito. Duas ou três horas, não lembro bem.
- Está acordado?
- Parece que sim. Mas não fala nem se move.
- Hm.
- Disseram que a luz daqui o está afetando. E que você saberia o que fazer.
- A luz? - e o homem olhou a sua volta - Não podemos mexer na iluminação.
- Não podemos? Deve ser por isso que os holofotes estão travados. Já tentamos desligá-los antes...
- Desculpe, mas o que você disse de a luz o estar afetando?
- Não reparou? Está perdendo cabelo. Quando o achamos creio que tinha quase o dobro do volume que tem agora. Olhe no chão. Cai como folha seca.
O homem aproximou-se do corpo imóvel. Seus olhos estavam semi-abertos, mas sem expressão. Ao redor da cabeça, os fios de cabelo aglomeravam-se.
- Parece que não é só isso...
- O que mais há?
O lado do corpo que estava sobre a madeira do tablado do teatro: repleto de queimaduras.
- E não sei se ele sente a dor.
- Não parece sentir coisa alguma...
- Daqui a quanto tempo as portas serão abertas?
- Exatamente vinte e um minutos. É noite de estréia. Já há fila na porta - e o homem que levara o outro até lá assumiu um tom nitidamente nervoso, esperando instruções sobre como agir.
- Bom, traga-me um café.
- Como?
- Café.
- ...
- Tem café aqui, não tem?
- Sim, claro... Bem... eu já volto.
A sós com o corpo sobre o tablado, o homem permaneceu a observá-lo por alguns segundos. Nada mudava. O teatro, gigantesco, estava deserto, mas dali a 19 minutos todas as poltronas estariam ocupadas, com caras ansiosas e absortas em qualquer coisa que lhes aparecesse sob a ribalta. A fila lá fora, apesar de formada, não se fazia perceber, nenhum ruído vazava pelo sistema acústico, para dentro do teatro. Assim, o homem permanecia em silêncio, imóvel como o outro. Até que se abaixou lentamente, a observar o corpo sobre a madeira.
O homem ali deitado mexeu-se devagar. Abriu os olhos de vez, preguiçosamente, e olhou na direção daqueles que o observavam. Sorriu. O homem sorriu também.
- Já pode ir.
O homem deitado suspirou. Piscou. Respirou mais forte. Espreguiçou. Só então lançou um olhar curioso àquele sentado ao seu lado. Mas ele se limitou a indicar-lhe o caminho da saída.
- Não precisa explicar nada. Melhor assim. E melhor que você não saiba também. Apenas vá embora. Certo?
E o homem levantou, calmamente, já sem nenhum indício de queimadura. Olhou os fios de cabelo no chão, mas pareceu indiferente. Caminhou meio trôpego, descendo as escadas, e só então as luzes, antes travadas, apagaram-se.
- Não muito. Duas ou três horas, não lembro bem.
- Está acordado?
- Parece que sim. Mas não fala nem se move.
- Hm.
- Disseram que a luz daqui o está afetando. E que você saberia o que fazer.
- A luz? - e o homem olhou a sua volta - Não podemos mexer na iluminação.
- Não podemos? Deve ser por isso que os holofotes estão travados. Já tentamos desligá-los antes...
- Desculpe, mas o que você disse de a luz o estar afetando?
- Não reparou? Está perdendo cabelo. Quando o achamos creio que tinha quase o dobro do volume que tem agora. Olhe no chão. Cai como folha seca.
O homem aproximou-se do corpo imóvel. Seus olhos estavam semi-abertos, mas sem expressão. Ao redor da cabeça, os fios de cabelo aglomeravam-se.
- Parece que não é só isso...
- O que mais há?
O lado do corpo que estava sobre a madeira do tablado do teatro: repleto de queimaduras.
- E não sei se ele sente a dor.
- Não parece sentir coisa alguma...
- Daqui a quanto tempo as portas serão abertas?
- Exatamente vinte e um minutos. É noite de estréia. Já há fila na porta - e o homem que levara o outro até lá assumiu um tom nitidamente nervoso, esperando instruções sobre como agir.
- Bom, traga-me um café.
- Como?
- Café.
- ...
- Tem café aqui, não tem?
- Sim, claro... Bem... eu já volto.
A sós com o corpo sobre o tablado, o homem permaneceu a observá-lo por alguns segundos. Nada mudava. O teatro, gigantesco, estava deserto, mas dali a 19 minutos todas as poltronas estariam ocupadas, com caras ansiosas e absortas em qualquer coisa que lhes aparecesse sob a ribalta. A fila lá fora, apesar de formada, não se fazia perceber, nenhum ruído vazava pelo sistema acústico, para dentro do teatro. Assim, o homem permanecia em silêncio, imóvel como o outro. Até que se abaixou lentamente, a observar o corpo sobre a madeira.
O homem ali deitado mexeu-se devagar. Abriu os olhos de vez, preguiçosamente, e olhou na direção daqueles que o observavam. Sorriu. O homem sorriu também.
- Já pode ir.
O homem deitado suspirou. Piscou. Respirou mais forte. Espreguiçou. Só então lançou um olhar curioso àquele sentado ao seu lado. Mas ele se limitou a indicar-lhe o caminho da saída.
- Não precisa explicar nada. Melhor assim. E melhor que você não saiba também. Apenas vá embora. Certo?
E o homem levantou, calmamente, já sem nenhum indício de queimadura. Olhou os fios de cabelo no chão, mas pareceu indiferente. Caminhou meio trôpego, descendo as escadas, e só então as luzes, antes travadas, apagaram-se.
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