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21.9.06

Meu pai morreu numa péssima hora.

O problema foi que ele tinha acabado de comprar um sorvete quando recebeu a notícia. Estava entrando no vagão do metrô com o sorvete na mão quando tocou o celular. Ele foi perguntando: como assim? O que ele teve? Que hospital? UTI? Não tem jeito? Mas...? ...? E o sorvete foi derretendo na mão dele. Primeiro pela casquinha, inundando o guardanapo que já não servia para mais nada, tomando conta dos dedos da mão, indo para o braço, e finalmente pingando no chão do vagão. Os passageiros em volta ficaram olhando, primeiro com nojo, mas depois que prestaram mais atenção e perceberam o conteúdo da conversa, tiveram pena. Ele desligou o celular. O sorvete não parava de escorrer. Ele só disse: "Puta que pariu, que merda."

7.9.06

(...)

Um dia ela ainda vai descobrir - ou quem sabe já descobriu - que todas aquelas parafernálias culturais só serviram pra sedar de vez aquele espaço apertado e incômodo em que ela entrara sem saber, pisando falso no solo e acabando perdida nas abstrações. Será um dia glorioso, e o mundo será visto objetivamente, nitidamente, sem borrão ou purpurina. Nada pra enfeitar. Nenhuma imagem com contraste alterado. Nenhum diálogo irretocável de um filme europeu. Um dia ela vai achar tudo isso um saco. Ela jura que vai. E parar de olhar cada referência dessas como se fosse um enviado especial de Deus, seja lá onde ele se encontre - sem letra maiúscula. Ela vai sentir o cheiro estragado de ar reciclado sem lembrar de nenhuma banda obscura.
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