(sem título)
Eram dois rapazes, um sentado ao lado do outro, num dos últimos bancos do ônibus velho e sujo. Pareciam da mesma idade. E, pelas feições do rosto, pelo porte e por outras características menos evidentes, deviam ser irmãos. Estavam já lá dentro quando o veículo atravessou a estrada principal e fez uma breve parada em um vilarejo poeirento e abandonado, mas que continha, ao menos, duas lanchonetes, sanitários e telefones públicos (dos quais, apenas um funcionava). O que parecia ser o mais velho dormia, largado no banco que dava para o corredor, o braço esquerdo largado e a boca semi-aberta. O outro estava à janela, de cabeça baixa. Não lia ou ouvia nada, mas parecia concentrado. Os olhos fixos em algum ponto entre os próprios sapatos e o estofado do banco da frente. Mexia nos dedos e às vezes mordia a boca, com ligeiros espasmos no rosto de tempos em tempos. O motorista vinha dirigindo-se de volta ao ônibus quando o irmão mais novo desceu por alguns minutos e, encostado na lateral do veículo, olhou por alguns instantes a estrada esburacada. Coçou a cabeça, ajeitou a camisa. E, quando voltou ao seu lugar, exibia uma ruga mais profunda na testa, entre as sobrancelhas, ali perto de uma cicatriz discreta, sobre os olhos pequenos e fechados, enquanto, ao longo do percurso, sua expressão era refletida borrada na janela do ônibus que cruzava veloz a estrada.
1 Comments:
Uma curiosidade: esses textos que vc cria se bastam em si mesmos ou têm toda uma historinha por trás que vc quem sabe um dia vai desenvolver?
Se a resposta certa for a primeira opção será um contraste engraçado comigo. Eu tenho várias histórias na cabeça que não consigo imaginar (muito menos transcrever) em cenas concretas. E vc então criaria cenas concretas sem histórias por trás.
Mas isso apenas é uma hipótese. ;)
By Edson, at quarta-feira, setembro 26, 2007
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